Impacto social do abuso do álcool e economia da saúde

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Introdução

Entre os problemas de ordem biopsicossocial decorrentes do abuso e/ou dependência alcoólica, que afetam tanto o próprio usuário.

Quanto seus familiares estão sofrimento e complicações físicas e mentais, desemprego, violência e criminalidade, mortalidade, morbidade, entre outros.

Todos estes problemas acarretam, significativamente, um elevado custo econômico para a sociedade.

Pouco tem sido feito, portanto, para mensurar, quantitativamente, suas conseqüências em nosso país.

Uma constatação da necessidade de ampliação desta discussão está no fato de que, atualmente, elementos fundamentais – como os custos indiretos – não estão sendo considerados nas estimativas de custos da dependência do álcool.

Os custos indiretos atingem não só os abusadores/dependentes de álcool, mas também, como exemplo, seus empregadores, que podem ter elevados gastos com perda de produtividade relacionada às doenças, licenças médicas e com o próprio consumo de álcool durante o trabalho.

Este artigo tem como objetivo principal introduzir e familiarizar os profissionais da saúde os conceitos fundamentais da economia da saúde (ES). Não obstante, visa também descrever alguns dados de pesquisa sobre o impacto do abuso de álcool na sociedade brasileira, com a pretensão de justificar a realização de pesquisas nacionais nesta área econômica.

Economia da saúde

A Economia da saúde (ES) procura aliar os conhecimentos adquiridos pela Medicina (segurança do procedimento, eficácia e efetividade da intervenção) ao conceito de eficiência – originado na Economia , com o objetivo de instrumentalizar os gestores de saúde em suas tomadas de decisão, principalmente quanto a um melhor aproveitamento de recursos frente às necessidades da sociedade. O conjunto dos estudos que utilizam estes conceitos pode ser chamado de Avaliação Econômica em Saúde (AE).

A AE pode ser classificada como incompleta e completa. Na AE incompleta, temos os estudos do tipo “custo da doença” e “comparação de custos”. A AE completa é o instrumento utilizado pela ES para a análise sistemática e comparativa de duas ou mais intervenções na área da saúde, considerando-se os custos e benefícios proporcionados.

Diante da complexidade de seu objetivo, a AE completa deve ser vista sob três diferentes vertentes:

Tipos de AE completa: custo-minimização; custo-efetividade; custo-utility e custo-benefício

1) Custo-minimização é a análise realizada quando duas ou mais intervenções proporcionam o mesmo benefício, diferindo apenas em relação aos custos. Esta análise não é uma muito utilizada uma vez que é raro encontrarmos intervenções que apresentem os mesmos benefícios comprovados cientificamente.

2) Custo-efetividade, mais comumente encontrado na literatura, é utilizado quando as intervenções apresentam desfechos clínicos semelhantes, porém diferenciando-se não só quanto aos custos, mas também quanto à extensão dos efeitos esperados. Ex: um tratamento ambulatorial para alcoolismo que atinge um determinado índice de abstinência, comparado a uma nova intervenção agregada a este tratamento ambulatorial, gerando melhores índices de abstinência.

 3) Custo-utility evidencia a preferência do indivíduo ou da sociedade por um estado de saúde ou desfechos específicos. O parâmetro mais comumente utilizado é o “Quality Adjusted Life Years – QALY” (sobrevida ajustada à qualidade de vida).

 4) Custo-benefício: os resultados são estimados em valores monetários. Devido à dificuldade, complexidade e controvérsias em se valorar a vida humana e determinadas condições de saúde em termos monetários, ainda é uma análise raramente encontrada na literatura.

É de fundamental importância para a AE a perspectiva sob a qual a análise de custos é feita. Baseia-se em quem irá arcar com os custos referentes ao programa estudado, além de definir quais serão os recursos (custos) incluídos para a análise. Exemplos de pontos de vista são: do paciente, da instituição de saúde, do Ministério da Saúde, ou, geralmente, da sociedade.

Na perspectiva do paciente, por exemplo, são considerados os custos referentes às consultas (quando pagas por ele), ao transporte entre sua residência ou local de trabalho até o local de tratamento, retorno, entre outros.

No entanto, a perspectiva da sociedade é a mais abrangente, pois considera todos os custos referentes ao programa, independente de quem irá pagar as despesas. Isto faz com que esta perspectiva seja considerada a mais apropriada para embasar as decisões tomadas na área da saúde.

Diferentes tipos de custos

Para melhor compreensão deste item, vale ressaltar que os termos recursos e custos são distintos, embora em todo recurso empregado incida um custo. Em uma AE completa, os custos podem ser classificados como diretos, indiretos e intangíveis:

1) Custos diretos: estão diretamente relacionados aos recursos oriundos da intervenção. São subdivididos em custos médico-hospitalares (custo de medicações, exames, internações, remuneração dos profissionais, consultas médicas e fisioterápicas, cirurgias, entre outros) e custos não médico-hospitalares (transporte de ida e volta ao tratamento, contratação de terceiros para auxílio no tratamento, entre outros).

2) Custos indiretos: não estão diretamente relacionados à intervenção. No entanto, podem gerar custos tanto para os pacientes e familiares, quanto para empregadores ou para sociedade (ex: a redução/falta de produtividade do usuário e/ou familiar, devido ao tempo despendido para participação no programa de saúde ou de doenças decorrentes).

3) Custos intangíveis: são os mais difíceis de serem medidos ou valorados, pois se referem ao custo do sofrimento físico e/ou psíquico. Dependem, unicamente, da percepção que o paciente tem sobre seus problemas de saúde e as conseqüências sociais, como o isolamento. Geralmente, estes custos não são inclusos nas análises de custos, visto que ainda existe grande controvérsia sobre a metodologia para obtenção dos mesmos.

O impacto social dos transtornos relacionados ao uso do álcool

No Brasil, entre os anos de 1970 e 1996, ocorreu um acréscimo de 74,53% no consumo do álcool. Estima-se que 11,2% da população brasileira seja dependente de álcool. Este índice, dividido por gênero, aponta a dependência em 17,1% da população masculina e 5,7% da população feminina. Quando analisamos a distribuição etária deste consumo: 41,2% de alunos dos ensinos fundamental e médio da rede pública, entre 10 e 12 anos, fizeram uso de álcool.

O consumo de álcool pelos idosos também vem aumentando consideravelmente: 15% dos idosos que procuraram atendimento em determinado ambulatório de Geriatria na cidade de São Paulo apresentavam a condição de dependentes de álcool. No Brasil, o álcool é responsável por 85% das internações decorrentes do uso de drogas; 20% das internações em clínica geral e 50% das internações masculinas psiquiátricas.

Somente entre os anos de 1995 e 1997, as internações decorrentes do uso abusivo e dependência de álcool e outras drogas geraram um gasto de 310 milhões de reais. Além disso, estudo realizado em Recife, Brasília, Curitiba e Salvador detectou índice de 61% de casos de alcoolemia em pessoas envolvidas em acidentes de trânsito. Visto que o aumento do consumo de álcool eleva também a gravidade dos problemas decorrentes, conseqüentemente, o custo social será maior.

Conclusões

Cada vez mais, a sociedade brasileira vem sentindo o impacto do custo social gerado pelo uso abusivo de álcool, ao mesmo tempo em que percebe que os investimentos realizados não estão conseguindo reduzir os problemas decorrentes, tais como criminalidade, acidentes, violência doméstica, absenteísmo, desemprego e outros.

A razão para isso pode estar na má alocação dos recursos, uma vez que, no Brasil, ainda não existem parâmetros, baseados em evidências científicas, que sustentem uma correta tomada de decisão. Em alguns países desenvolvidos, onde também existe a preocupação com os custos sociais gerados pelo abuso e/ou dependência química, tal decisão vem sendo respaldada pela realização de estudos de AE nesta área.

Resultados já obtidos por estes estudos demonstram a importância deste tipo de avaliação na tomada de decisão quanto à alocação de recursos em intervenções que possam vir a minimizar, de forma comprovadamente custo-efetiva, a incidência desses custos para a sociedade.

Embora os dados obtidos sejam considerados válidos apenas para os países onde as pesquisas foram realizadas, alguns resultados serão demonstrados, de forma a realçar a importância da AE na DA. Entre outras constatações, já foi verificado que:

 1) Intervenções de baixo custo podem ser tão efetivas quanto aquelas de custo mais elevado;

2) intervenções mais custo-efetivas nem sempre são mais baratas de serem implementadas;

3) o custo-efetividade de abordagens como a Entrevista Motivacional Breve é maior que em outras intervenções;

4) desfechos voltados para a saúde, com tratamentos psicossociais – incluindo Entrevista Motivacional e Treinamento de Habilidades Sociais – apresentam redução do custo social.

O objetivo principal de estudos científicos que aliem a AE ao uso abusivo e/ou DA é propiciar o maior ganho de saúde possível, com a menor utilização dos escassos recursos destinados ao sistema saúde.

Fonte: Site Álcool e Drogas sem Distorção (www.einstein.br/alcooledrogas)/Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein

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